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Mulheres na segurança pública com foco nas Guardas Municipais: Evolução profissional e tabus a quebrar


 

GM Fontes, integrante da Guarda Municipal de São Gonçalo do Amarante. Foto: Arquivo da GM Fontes.

Texto por Alan Santos Braga

 

Resumo: O texto apresenta informações a respeito da atuação das mulheres na segurança pública, evolução profissional, assédios, tabus, ingresso na carreira, e principalmente a questão das mulheres nas Guardas Municipais.

 

Palavras-chave: Guarda Municipal, mulher, Gênero, Tabu

 

Introdução

Cada vez mais as mulheres vem conquistando diversos espaços, mostrando que não existe essa coisa de sexo frágil e que o lugar de mulher é onde ela quiser, entretanto ainda existem tabus e preconceitos a se quebrar que giram em torno das mulheres em algumas atividades como a de segurança pública, que por muitos anos foram predominantemente masculina.

Na carreira de segurança pública no Brasil, o ingresso de mulheres ainda é considerado algo recente, tendo como o seu marco a criação de um grupo exclusivamente composto de mulheres por meio do Corpo Feminino da Guarda Civil do Estado de São Paulo, no ano de 1955, na qual este grupo veio a ser integrado à recém formada Polícia Militar do Estado de São Paulo nos anos de 1970, sendo ampliado paulatinamente entre os demais órgãos de segurança pública das demais unidades da federal brasileira, sendo essa introdução das mulheres na segurança pública como um todo de maneira definitiva a partir da
Constituição Federal de 1988, com a introdução dos princípios de respeito aos direitos humanos, onde se tinha a ideia de uma segurança pública mais cidadã, buscando se cumprir também o acordo assinado pelo Brasil através do Pacto de San José de Costa Rica.

Na Bahia, por exemplo, a primeira turma de mulheres a ingressar na Polícia Militar, no ano de 1990, onde no dia 30 de abril de 2020, completou 30 anos do ingresso do primeiro corpo feminino militar, escrevendo uma nova história nesta corporação policial, tendo que inclusive serem adaptados alguns espaços para atender e respeitar essa demanda, como alojamentos e banheiros, que até então eram exclusivamente ocupados por homens.


Cotidianos, evolução profissional, assédios: Rotinas que fazem parte das mulheres que atuam como agentes de segurança pública


Segundo Brow (1997, apud CALAZANS, 2009), os fatores que explica-se o ingresso das mulheres nas forças policiais no mundo a fora, onde na Europa, esse ingresso da mulher na segurança pública estaria ligado a momentos de crise nas policias, como por exemplo o grande deslocamento de homens para as grandes guerras que ocorreram no mundo, a deterioração da imagem pública das policias, e o ingresso das mulheres estaria ajudando à melhorar, mostrando uma força polícia mais preventiva e cidadã, assim como fazendo com que a entrada das mulheres houvesse a equiparação de oportunidades iguais para ambos os sexos, sem haver discriminações por questões de sexo. No que tange ao Brasil, as mulheres tem sido cada vez mais presentes nas instituições de segurança pública, inclusive nas Guardas Municipais, onde em alguns concursos tem vagas destinadas especificamente só para as mulheres concorrerem entre elas.

Pode-se afirmar que cada vez mais as mulheres vem se destacando no campo profissional nas mais diversas profissões, inclusive na área de segurança pública, como por exemplo a Major Denice na Polícia Militar da Bahia, que estava à frente da Ronda Maria da Penha, e ajudou a difundir esse trabalho de proteção as mulheres vítimas de violência no estado, a Inspetora Iranildes Amado da Guarda Municipal de Lauro de Freitas, que vem buscando trabalhar as ações preventivas de proteção as mulheres vítimas de violência, do empoderamento feminino nas forças de segurança pública principalmente nas Guardas Municipais, e também ajudado a multiplicar diversas ações sociais através da Guarda Municipal.

Conforme a Pesquisa Perfil das Instituições de Segurança Pública (SENASP, 2011), foi apurado que a participação feminina nas Policiais Civis corresponde a 25% do efetivo nacional. Nas Polícias Militares e Bombeiros, essa participação é de 7,2% e 7,9%, respectivamente. Já nas Guardas Municipais ainda não há dados concretos que apresentem números mais próximos da realidade atual de todas essas instituições no Brasil inteiro. No que tange a questão das rotinas profissional das mulheres que atuam como agentes de segurança pública, pode-se afirmar que também os assédios moral e sexual infelizmente fazem parte de seu dia-a-dia, dependendo muito das instituições e unidades de serviço destas e seus níveis de hierarquização e que tem uma predominância maior masculina, num lugares com mais intensidade e em outro com menos, onde ainda se falta trabalhar melhor a questão dos Direitos Humanos dos Agentes de Segurança Pública como um todo, para estar inclusive combatendo questões como essa que ocorrem em todas essas instituições, sejam de nível federal, estadual ou municipal. Nos treinamentos, as pressões de adestramento nas funções, fazem até que em muitas vezes as mulheres venham a internalizar e absorver preconceitos, assumindo inclusive atitudes negativas masculinas.

Ao longo do tempo vem se quebrando os tabus em relação a atuação das mulheres na segurança pública, onde as mesmas tem demonstrado cada vez mais efetivamente capacidades técnicas, porém falta ainda muitas instituições proceder o devido reconhecimento das mulheres nestas instituições, inclusive buscando fazer o devido ajustamento para progressão na carreira, adequar alguns materiais as questões de gênero como fardamentos e equipamentos de proteção individual, como coletes balísticos feminino, e instalações adequadas para o uso feminino.

Nas Guardas Municipais, o cenário muda entre as mais diversas instituições, principalmente entre aquelas maiores e as menores, onde geralmente nas que estão mais organizadas, que geralmente são as maiores, existe já um parâmetro mais próximo em termos de ajustamentos, e nas menores, geralmente um desleixo por falta de investimentos da gestão municipal que não só atingi as mulheres daquela instituição, mas como todos, e que nestas menores, muitas vezes o trabalho das mulheres ainda tem um certo desprezo por meras questões de uma cultura institucional ruim, que não há um trabalho de valorização de todo o efetivo da corporação, na qual uma inexistência de uma política institucional agrava a situação de valorização destas mulheres. Mas devido ao empenho profissional de muitas mulheres pelas Guardas Municipais pelo Brasil a fora, é possível encontrar muitas em cargos de chefia, e inclusive no comando de algumas destas Guardas Municipais, como por exemplo as GM´s Elisangela Fraga Nogueira, sendo a primeira e atual comandante da Guarda Municipal de Vila Velha, no estado do Espirito Santo e Elza Paulina Souza, sendo a primeira e atual comandante da Guarda Civil Metropolitana de São Paulo, Glayte Paraíso, que é Inspetora da Guarda Municipal de Autazes e instrutora de ROMU (Rondas Ostensivas Municipais) no estado do Amazonas, e além disso desenvolve um grande trabalho de união dos guardas municipais neste ano no norte do Brasil.

Dentro os vários assuntos tratados sobre a questão da mulher na segurança pública, e especificamente da mulher nas instituições de Guardas Municipais, ganham uma questão maior a falta de políticas institucionais que visem a valorizar a presença das mulheres, assim como o de todo o efetivo da Guarda Municipal, além da aposentadoria especial, saúde mental e física pois além das pressões existentes no meio profissional as mulheres tem uma dupla jornada de trabalho, uma com suas famílias e outra no desempenhar de suas atividades da função de guarda municipal, tendo essa lista de temas e situações no cotidiano das mulheres uma amplitude bem maior, que é necessário outros estudos, pesquisas e aprimoramento de ideias para promover possíveis soluções para amenizar ou mesmo resolver essas diversas problemáticas. Tratando-se em termos de Guarda Municipal, a Lei Federal nº 13.022/14, na qual trata do Estatuto Geral das Guardas Municipais, em seu Art. 15, §2º, deixou claro que não deve se haver uma discrepância no tratamento com as mulheres na progressão da carreira de guarda civil municipal, devendo haver inclusive um percentual mínimo para que elas em todos os níveis hierárquicos, para que não existir uma desvalorização das mesmas nestas instituições só por serem mulheres, ajudando a desfazer tabus e culturas institucionais que tratem a mulher com inferioridade, garantindo a elas também possam ter suas devidas progressões funcionais na carreira, havendo equiparação de oportunidades, sem haver discriminações por sexo, conforme pode ser visto na citação do artigo:

“Art. 15...

...

§ 2º Para ocupação dos cargos em todos os níveis da carreira da guarda municipal, deverá ser observado o percentual mínimo para o
sexo feminino, definido em lei municipal.

...”

Atualmente as mulheres tem ocupado diversas funções nas Guardas Municipais em geral, inclusive estando presentes nos mais diversos grupamentos existentes, onde segundo Brown (1997, apud CALAZANS, 2009), a inserção progressiva das mulher nas polícias e a modernização das organizações policiais são fenômenos que andam interligados, já que o trabalho policial vem tendo mudanças ao longo do tempo, inclusive ocorrendo mudança da características de seus valores da organização, e a questão de se ter somente a força física como a única coisa importante desta atividade vem caindo cada vez mais. Consequentemente as Guardas Municipais, ao longo do tempo vem seguindo esta mesma tendência, tendo uma participação cada vez mais ativa das mulheres, tendo cada vez mais ingresso destas nesta carreira.

 

Mulheres na Guarda Municipal de São Gonçalo do Amarante

 

A Guarda Municipal de São Gonçalo do Amarante existe a seis anos, os 17 (dezessete) integrantes que compõe essa instituição, sendo 12 (doze) homens e 5 (cinco) mulheres, que desenvolvem diversas ações no município, onde dentre os agentes desta instituição, destaca-se a GM Fontes, que foi da coordenadora do 1º Encontro de Guardas Municipais Femininas do Estado do Rio Grande do Norte, que teve a temática “A atuação Feminina no Contexto da Segurança Pública”, realizado no auditório do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, na cidade de São Gonçalo do Amarante, em dezembro de 2019.

A GM Fontes, que vem de uma história de vida pessoal fascinante, sendo órfã de pai e mãe, mas que mesmo assim não desistiu de buscar melhores condições de vida, assim como uma carreira profissional que pudesse te dar uma realização pessoal e um futuro digno, também desenvolve palestras preventivas nas Unidades Básicas de Saúde e também nas escolas sobre diversas temáticas como bullying, violência, drogas e sexualidade, além de realizar um trabalho de ações sociais dentro do município de São Gonçalo do Amarante, e tem buscado junto com os demais integrantes da instituição a implantação da Patrulha Maria
da Penha da Guarda Municipal, onde inclusive já existe legislação municipal 
sobre está atividade que deveria estar sendo feita pela Guarda Municipal, porém falta a sua implementação na prática.

Ações desenvolvidas como essas da GM Fontes, no município de São Gonçalo do Amarante, é justamente uma das questões que preconiza a Lei Federal nº 13.022/14, no que tange aos princípios mínimos de atuação das instituições de Guardas Municipais, como a proteção dos direitos humanos fundamentais (dentre esses a proteção à vida conforme a Constituição Federal de 1988), preservação da vida, a redução de sofrimentos e diminuição de perdas, e assim como o compromisso com a evolução social da comunidade, conforme
pode ser visto no artigo 3º desta legislação federal:

 

“Art. 3º...

I - proteção dos direitos humanos fundamentais, do exercício da cidadania e
das liberdades públicas;

II - preservação da vida, redução do sofrimento e diminuição das perdas;

...

IV - compromisso com a evolução social da comunidade; e

V - uso progressivo da força.”

 

O ciclo de ações preventivas e sociais ajudam a fortalecer a relação da Guarda Municipal com a sociedade, fazendo jus a um dos grandes lemas utilizado pelas Guardas Municipais com os dizeres, “Patrulheiro, Protetor e Amigo”, mostrando-se ser uma instituição que se preocupa com a segurança dos cidadãos e com o bem-estar da sociedade.

 

Conclusão

 

Evidencia-se que há uma falta mais literaturas que tratem da atuação das mulheres na segurança pública como um todo, e principalmente nas instituições de Guardas Municipais, mostrando-se incipiente, onde normalmente se tem essas informações voltadas para questão quantitativa de efetivo, entretanto isso não minimiza a importância da mulher na segurança pública como um todo e em especificamente nestas instituições municipais.

No entanto novas pesquisas sobre a segurança pública, e principalmente sobre a atuação das mulheres nesta área, assim como as ações de proteção de mulheres vítimas de violência tem ajudado a haver um aprofundamento nesta temática e em pesquisas especificamente sobre a atuação das Guardas Municipais, onde se mostra a importância da mulher dentro destas corporações e a compreender a cultura organizacional das Guardas Municipais em diferentes locais do Brasil.

Assim como nas demais instituições de segurança pública, é evidente que as mulheres nas Guardas Municipais também passam por pressões, assédios e perseguições, e da mesma forma também tem mostrado suas capacidades, que em vários casos tem ajudado até a melhorar a imagem da instituição perante a sociedade.

 

Referências Bibliográficas:

 

BRASIL. Lei Federal nº 13.022, de 08 de agosto de 2014. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l13022.htm>. Acesso em: 08 mar 2020.

CALAZANS, Márcia Esteves de. Polícia e Gênero no Contexto das Reformas
Policiais. La Salle – Revista da Educação, Ciências e Cultura, v.10, n.2, 2005; Disponível em: <https://issuu.com/natasha.leite/docs/12226>. Acesso em 15
mar 2020.

PANCHERI, Ivanira. Mulheres policiais e violência psicológica: Reflexos para a
segurança pública. Disponível em <http://estadodedireito.com.br/mulherespoliciais-e-violencia-psicologica-reflexos-para-seguranca-publica/>. Acesso em 15 mar 2020.

PASINATO, Wânia. Mulheres na segurança pública. Disponível em
<https://www.cartacapital.com.br/sociedade/mulheres-na-seguranca-publica/>. Acesso em 20 mar 2020.

 

Sobre o Autor:

 

Alan Santos Braga (GCM Braga)

Guarda Civil Municipal de Salvador/BA

Autor dos livros “Desvendando as Guardas Civis Municipais”, “Guarda Municipal
e a Ronda Escolar”, “Guarda Municipal e a Proteção do Meio Ambiente” e “Estruturação Organizacional das Guardas Municipais”


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